Pesquisa FURB indica sinais de dependência do celular entre adolescentes de Blumenau
Por Camila Maurer [10/10/2025] [13 h52]
Um estudo desenvolvido no curso de Medicina da Universidade Regional de Blumenau (FURB) investigou o nível de dependência do celular entre adolescentes que estudam em uma escola de Ensino Médio de Blumenau e identificou sinais sugestivos de dependência em 100% dos participantes. A pesquisa foi conduzida pelas estudantes Júlia Eger Demarchi e Sophia Castelo de Souza Nemetz, sob orientação da professora Daniela Maysa de Souza, Doutora em Enfermagem. O objetivo das pesquisadoras é promover a reflexão sobre o tema e incentivar a adoção de estratégias que promovam o uso equilibrado das tecnologias digitais.
Todos os participantes apresentaram sinais sugestivos de dependência do celular, na maior parte dos casos, em nível moderado. O estudo revelou, ainda, que a maior parte dos estudantes utiliza o celular para interação social através de plataformas de redes sociais. Entre os adolescentes que participaram do estudo, houve relatos de sintomas de ansiedade e nervosismo quando se afastam do aparelho. O estudo não identificou correlação significativa entre dependência e variáveis como idade, gênero ou série escolar, o que indica um padrão de uso generalizado. Quase 50% dos estudantes relataram acessar o celular mais de 30 vezes por dia; 47% relataram manter o celular por perto mesmo em casa.
A dependência digital não é classificada como transtorno específico, mas entidades médicas alertam para potenciais prejuízos à saúde física e mental. O uso excessivo de telefones celulares e outros tipos de telas está associado a uma série de prejuízos à saúde, como sedentarismo, problemas visuais, transtornos do sono, irritabilidade, ansiedade, depressão, transtornos do déficit de atenção e hiperatividade. A Sociedade Brasileira de Pediatria tem alertado para os riscos do excesso de exposição das crianças e adolescentes a smartphones, tablets, televisão e videogames. A entidade recomenda que as famílias evitem expor crianças menores de dois anos às telas sem necessidade, mesmo que passivamente. Crianças entre 2 e 5 anos devem ter o tempo de tela limitado a, no máximo, 1 hora por dia, enquanto crianças entre 6 e 10 anos não devem ultrapassar duas horas diárias (em ambos os casos, com a supervisão de pais ou responsáveis). Segundo a entidade, adolescentes entre 11 e 18 anos (faixa etária que inclui os participantes da pesquisa) não deveriam gastar mais do que 3 horas por dia usando telas.
Pesquisadoras promoveram ação educativa para professores e estudantes
Diante dos resultados obtidos pelo estudo, as pesquisadoras realizaram ações educativas com estudantes e professores da Etevi. Na ação realizada com os estudantes, as pesquisadoras alertaram para a necessidade de usar as tecnologias digitais de forma equilibrada, tendo em vista os potenciais prejuízos ao desenvolvimento e saúde mental. Com os professores, foram levantadas questões como a necessidade de abordar a educação digital em sala de aula e formas de identificar sinais de abuso no uso das tecnologias digitais. “Na nossa sociedade de hoje, é ilusório a gente achar que o adolescente não vai usar o celular, já faz parte da nossa rotina. Uma peça-chave que a gente abordou foi explicar como fazer o uso correto e incentivar os professores a ensinarem dentro do âmbito escolar”, explica Sophia Castelo de Souza Nemetz.
Parte do conteúdo trabalhado com estudantes e professores é proveniente do documento Crianças, Adolescentes e Telas: um Guia sobre o Uso de Dispositivos Digitais, lançado pelo Governo Federal em março. Entre as orientações trazidas pelo documento, está a necessidade mediação ativa por parte dos adultos (familiares, responsáveis e educadores).
Como o estudo foi realizado
O estudo contou com a participação de 65 estudantes de primeiro, segundo e terceiro ano da Etevi, a escola de Ensino Médio da FURB. Embora o número de participantes represente apenas uma fração dos estudantes da escola, a análise estatística assegurou um nível de confiança de 94%, o que reforça a validade dos resultados obtidos. Em novembro de 2024, os estudantes responderam a um formulário online que incluía questões sociodemográficas e a Escala de Dependência do Celular, instrumento composto por 16 itens que avaliam sinais sugestivos de dependência. Cada uma das questões da Escala apresenta três opções de resposta: 0 (nunca ou raramente), 1 (frequentemente) e 2 (sempre).
A soma das respostas indica o nível de dependência: somas até 2 indicam uso controlado, sem sinais de abuso; de 3 a 12 apontam dependência leve; de 13 a 22 sugerem dependência moderada, já com prejuízos à rotina; de 23 a 32 indicam dependência grave, com impactos em vários aspectos da vida. As pesquisadoras ressaltam que a Escala não permite a realização de um diagnóstico propriamente dito, mas fornece elementos importantes para reflexão. “É uma escala que indica, a partir do score final, sinais sugestivos para a gente prestar atenção”, explica Daniela Maysa de Souza, orientadora da pesquisa.
O estudo foi realizado em novembro de 2024, antes, portanto, da lei que proibiu o uso de celulares nas escolas. Agora, as pesquisadoras pretendem iniciar um segundo momento da pesquisa que permita realizar um comparativo entre a realidade atual e os dados identificados no final do ano passado. “Temos dois caminhos: avaliar como foi a implementação dessa lei, se realmente trouxe mudanças comportamentais e reduziu o número sugestivo de intoxicação digital; e avaliar como os professores têm percebido essa participação dos estudantes. A gente vem percebendo que voltou a aparecer, por exemplo, bilhetinho em sala de aula, que antes não existia mais, o olho no olho, as conversas. Então, a gente já vê um lado benéfico para o próprio relacionamento interpessoal em sala de aula. Agora, a gente quer cientificamente verificar os sinais sugestivos de intoxicação digital”, explica a orientadora do estudo.
FURB Pesquisa
O trabalho foi tema do programa FURB Pesquisa desta semana: