Pesquisa FURB revela aspectos fundamentais para qualidade de vida de pacientes com câncer avançado
Por Camila Maurer [22/11/2024] [15 h58]
Pesquisa desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Universidade Regional de Blumenau (PPGSC/FURB) revelou que a condição de saúde, o suporte social e o peso da fé são aspectos determinantes para a qualidade de vida de pacientes com câncer avançado sob tratamento quimioterápico. A conclusão é de um estudo conduzido pelo pesquisador Cristiano Hansen, oncologista, mestre em Saúde Coletiva e professor do curso de Medicina da FURB, sob orientação do professor Carlos Roberto de Oliveira Nunes, Doutor em Psicologia e professor do Mestrado em Saúde Coletiva. O objetivo dos pesquisadores é fornecer subsídios para uma melhor compreensão sobre a qualidade de vida dos pacientes oncológicos, aspecto ainda pouco presente na literatura especializada.
“Nós conseguimos perceber, comparando com outros dados da literatura, que nossos pacientes tiveram uma qualidade de vida razoavelmente preservada durante o tratamento do câncer e considerada boa na perspectiva dos próprios pacientes. Dois terços dos pacientes afirmaram que a qualidade de vida estava boa durante o tratamento”, conclui Hansen. De acordo com o pesquisador, alguns estudos demonstram que a qualidade de vida dos pacientes é fator preditor de tempo de vida e perspectiva de cura, o que corrobora a importância do estudo.
Os participantes da pesquisa são pacientes oncológicos atendidos pelo pesquisador entre junho de 2023 e abril de 2024 no ambulatório de oncologia do Hospital Santa Isabel, em Blumenau. Nesse período, foram atendidos 169 pacientes, 21 deles em estágio avançado, o que corresponde a 12% do total. A proporção é semelhante ao reportado por outros serviços de oncologia do país, mas, de acordo com o pesquisador, pode apresentar variações regionais. Destes, 11 estavam em tratamento quimioterápico e nove aceitaram participar da pesquisa. Entre os 169 pacientes atendidos durante o período, os tumores de mama (29,7%) e colorretal (16,9%) foram os de maior prevalência, seguidos pelos tumores de cabeça e pescoço (10,8%), colo uterino (8,1%), encéfalo (6,1%), pulmão (5,4%), estômago (4,1%), ovário (3,4%), próstata (2,7%), endométrio (2,7%) e hepatocarcinoma (2,7%).
A combinação entre métodos quantitativos (questionários e escalas) e qualitativos (entrevistas semiestruturadas e análise de conteúdo) revelou que a condição de saúde, o suporte social e o peso da fé ou esperança são determinantes de qualidade de vida para os pacientes com câncer avançado sob tratamento. “O primeiro determinante é a própria condição de saúde das pessoas. Isso remete também ao estilo de vida dessa pessoa ao longo da sua história de vida. Independentemente de ter uma doença, a pessoa pode ter uma boa condição de saúde”, explica Hansen.
O suporte social, isto é, a rede de apoio de que os pacientes dispõem, é outro determinante identificado pelos pesquisadores. Dois terços dos pacientes entrevistados eram casados ou tinham uma união estável, o que, na percepção dos pesquisadores, pode ter contribuído para a percepção positiva em relação à qualidade de vida. “Se a condição de saúde vacilava, contar com a ajuda de um irmão ou outro parente é importante. Se a condição de saúde vacilava tanto a ponto de a pessoa não conseguir manter a própria funcionalidade para tomar banho, vestir-se ou trabalhar, a rede de suporte dos amigos, dos familiares, era importante. Não apenas o apoio afetivo, mas também financeiro”, enfatiza o pesquisador.
O peso da fé ou esperança completa o tripé sobre o qual se sustenta a qualidade de vida dos pacientes com câncer avançado, de acordo com a análise conduzida pelos pesquisadores. Hansen enfatiza, no entanto, que os determinantes identificados podem condicionar a qualidade de vida dos pacientes tanto para o bem quanto para o mal. Expectativas excessivas em relação a uma possível cura, por exemplo, podem ser prejudiciais à condição psicológica do paciente.
Os pesquisadores identificaram, ainda, que o estigma relacionado ao câncer é um fator prejudicial à qualidade de vida dos pacientes oncológicos. Hansen explica que o estigma opera como um roubo da identidade dos sujeitos. De acordo com o pesquisador, em alguns casos, a ideia de ter câncer ou de ser tratado de forma diferenciada por conta dele é mais prejudicial ao paciente do que as próprias consequências físicas da doença. “A melhor forma de lidar com o câncer é levar com naturalidade. Cabe ao profissional ser muito franco nas discussões e não perder a expectativa de melhorar a qualidade de vida e, se possível, curar esses pacientes, não retirar de forma sumária essa perspectiva otimista de boa parte dos pacientes, porque isso pode comprometer não só a qualidade de vida, mas os resultados do tratamento”, enfatiza Hansen.
Parte dos resultados obtidos pelo estudo de Hansen e Nunes foi aceito para publicação na Revista Brasileira de Cancerologia. Como desdobramentos futuros, os pesquisadores pretendem propor a replicação do estudo em outros centros de oncologia. As conclusões sobre a centralidade do suporte social sugerem, ainda, a possibilidade de conduzir estudos futuros que focalizem a percepção dos familiares envolvidos no tratamento.
Decisão sobre tratamento quimioterápico depende de diálogo entre médico e paciente
Pacientes com câncer avançado constituem uma parcela significativa dos atendimentos que chegam aos serviços oncológicos, devido à demora no diagnóstico de alguns casos. Hansen explica que o câncer é considerado avançado quando as células tumorais se disseminam para outras estruturas do corpo, diferentes do órgão em que o tumor se originou. A decisão sobre a realização de tratamento quimioterápico nos casos em que há pouca perspectiva de cura é tomada a partir do diálogo entre médico e paciente, considerando questões como a condição de saúde do paciente, a possibilidade de tolerar possíveis efeitos adversos e a chance de obter benefícios a partir do tratamento, como o prolongamento da vida ou a manutenção da qualidade de vida. Na avaliação do pesquisador, o diagnóstico de câncer avançado não deve ser encarado como uma sentença, apesar das incertezas envolvidas no tratamento. “É um compromisso ético da Medicina: se não for possível curar, ao menos confortar, aliviar os danos”, enfatiza o pesquisador.
No Brasil, o Instituto Nacional do Câncer estima cerca de 700 mil novos casos de câncer por ano até 2025. Em 27 de novembro, lembra-se o Dia Nacional de Combate ao Câncer, instituído em 1988 pelo Ministério da Saúde com o objetivo de fomentar a consciência da população em relação ao diagnóstico precoce e medidas de prevenção.
FURB Pesquisa
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